Em sentença proferida nesta quinta-feira (24), a justiça eleitoral absolveu o vereador de Candeias Arnaldo de Araújo (PSDB), acusado pelo Ministério Público por ter cometidos crimes eleitorais nas eleições municipais de 2016.
Arnaldo é opositor ferrenho do Prefeito Dr. Pitágoras que torcia pela sua cassação.
Confira a sentença:
Despacho
Sentença em 24/10/2019 – AIJE Nº 66605 JOÃO PAULO GUIMARÃES NETO
O Ministério Público Eleitoral ajuizou em face de Arnaldo Araújo a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral, alegando, em apertada síntese, que chegou ao seu conhecimento que o representado Arnaldo Araújo praticou, durante o processo eleitoral do ano de 2016, abuso de poder econômico, a fim de que comprovasse os votos efetuados pelos eleitores para sua candidatura ao cargo de vereador no município de Candeias/Ba .
Alega a acusação que pessoas de prenome Angélica, Osvanei, Telma e Tiago, cujos depoimentos constam, respectivamente, às fls. 04, 23 e 26 destes autos, foram abordados pela Senhora Dejanira Cristina Silva Costa, conhecida por “Deija” no bairro conhecido por Urbis I, no município de Candeias-Ba, que lhes ofereciam a quantia entre R$50,00 (cinquenta reais) a R$150,00 (cento e cinquenta reais), pelo voto ao então candidato Arnaldo do Ponto Econômico, procedimento este detalhado pelas referidas testemunhas.
Segundo consta dos depoimentos das testemunhas, “Deija” anotava os nomes, números das inscrições eleitorais e as seções que os eleitores votavam, bem como exigia que, como condição para o pagamento da “gratificação” , os eleitores cooptados deveriam comprovar o voto no então candidato Arnaldo mediante a fotografia da urna no momento do voto.
Em outro turno, as testemunhas Carlos Eduardo, Rogério e Adailton, depoimentos de fls. 31, 33 e 35, respectivamente, também foram abordados por uma pessoa de prenome William, proprietário do Mercadinho Carro Cheio, que também lhes oferecido dinheiro em troca de votos ao então candidato Arnaldo, ficando também condicionado o pagamento mediante à comprovação do voto com a fotografia da urna.
De posse das narrativas supra, o Ministério Público Eleitoral requereu a busca e apreensão de documentos nos endereço domiciliar e comercial de Arnaldo Araújo, William e “Deija” .
Autorizada pelo Juízo a referida medida, foram encontrados no endereço comercial do então candidato Arnaldo Araújo documentos que comprovariam a contabilidade das práticas supra narradas, com diversas anotações de compra de “produtos” , “cestas básicas” , “boi” e “multa de título” e, notadamente, uma agenda onde constavam anotações com uma farta relação de pessoas e valores que foram desembolsados, com distribuição de cestas básicas nas localidades onde a prática de compra de voto estariam sendo realizada.
Foi encontrada também no endereço comercial de Arnaldo uma outra agenda constando o nome de William como sendo liderança de campanha, sendo anotada a remessa de R$15.000,00 para o suposto líder, bem como o registro de pagamentos para “grávida da boa nova” ; “irmã da grávida” ; bota ortopédica para o menino da “fonte do mato” .
Já nas dependências do mercado Carro Cheio, foi apreendida uma planilha de custo da campanha de Arnaldo, detalhando as despesas pagas a título de distribuição de cestas básicas, fralda geriátrica e despesas hospitalares, bem como foram encontrados diversos títulos de eleitores, comprovantes de votação e documentos pessoais.
Em sua defesa de fls. 323/357, Arnaldo Araújo em sede de preliminar aponta para necessidade de composição do litisconsórcio passivo necessário entre o então candidato beneficiado e os agentes tidos com responsáveis pela suposta prática ilegal, conforme vasto entendimento jurisprudencial nesse sentido.
O mencionado pedido preliminar foi indefiro pelo Juízo Eleitoral da 127ª Zona/Ba, conforme decisão interlocutória de fls. 493/495.
No mérito, em sua defesa o Senhor Arnaldo aduziu que a parte representante foi induzida ao erro através de uma articulação de natureza política perpetrada pelos seus adversários, não condizendo com a realidade dos fatos.
Nesse particular, alega o representado que todas as testemunhas foram cooptadas para prestarem falsamente depoimentos perante ao Ministério Público Eleitoral, tratando-se portanto “de depoimentos fabricados, obtidos de forma ardilosa e articulada por políticos ligados ao grupo adversário” .
Continua asseverando o representado que os depoentes fazem parte do grupo político adverso ao seu, e que não faria sentido cooptar pessoas ligadas a esse grupo, ficando provada por detalhe a fraude montada no sentido de imputar-lhe falsamente a conduta ilícita de compra de voto.
Corroborando com a afirmativa supra, afirmou o representado que entre os depoentes alguns são filiados a partidos políticos adversários, “derrotados” nas eleições de 2016, e outros fazem parte grupos também “derrotados” no mesmo pleito. Indagando o porquê somente efetuaram a denúncia após o resultado das mencionadas eleições.
No que se refere aos documentos apreendidos durante a busca, alega o representado que é comerciante e proprietário do mercado Ponto Econômico, e que nessa condição é sempre procurado a colaborar com eventos sociais e solidários em prol da comunidade. Assim, as anotações contidas das agendas apreendidas se referem a tais doações, tais como “10 cestas para o Pastor Jaime e 08 cestas para o Pastor Antônio” , não constando inclusive das anotações datas que se possa inferir que tenham sido realizadas durante o processo eleitoral de 2016.
Já quanto ao repasse de R$15.000,00 para a pessoa de nome William, seria pelo fato do mesmo fazer parte do grupo de campanha do então candidato, bem como que os documentos apreendidos no Mercado Carro Cheio, de propriedade do Senhor William, alega Arnaldo que desconhece a origem de tais documentos e que os mesmos não foram encontrados em sua posse, o que descaracterizaria a prática de compra de votos pelo mesmo. Supondo que as anotações e documentos encontrados na posse do Senhor William seriam também doações para eventos ocorridos no município de Candeias/Ba.
Finalmente, alegou a parte representada que todas as condutas que lhes são imputadas na exordial não se desincumbiram da obrigação de provarem a sua participação ou anuência, mesmo que de forma indireta, não havendo, portanto, prova robusta e o dolo específico, não existindo sequer indícios da ocorrência de gastos em prol da candidatura do investigado, requerendo então o julgamento da presente ação como sendo improcedente.
Em audiência realizada na 127ª Zona Eleitoral em 04/09/2017 foram ouvidas as testemunhas Angélica da Silva, Osvalnei dos Santos, Telma dos Santos, Tiago de Mendonça Reis e Wlliam Bispo dos Santos, sendo que este foi ouvido na qualidade de declarante/informante da parte investigante.
Nessa assentada, com exceção da testemunha Angélica da Silva, houve a retratação das demais, com referência ao quanto informado no depoimento na fase investigatória.
Na assentada, o Ministério Público Eleitoral insistiu na oitiva da testemunha não localizadas Adailton Ferreira dos Santos , Carlos Eduardo Soares de Vargas e Rogério Santos da Silva.
De todo o exposto, o MM. Juiz Zonal deferiu o pedido ministerial, suspendendo a audiência e designando o dia 25/09/2017, para sua continuação. Sendo que, após diversos adiamentos, esta prosseguiu no dia 23/02/2018, na oportunidade em que foram ouvidas as testemunha Carlos Eduardo Soares Vargas e Dejanira Cristina Silva Costa.
Nessa assentada, o Ministério Público requereu a localização da testemunha Adailton Ferreira dos Santos, na região do Sul do país, bem como buscar informação referente ao estado de saúde da testemunha Rogério Santos da Silva, sendo tal requerimento deferido pelo juízo, que designou o dia 23/03/2018, para continuação da referida audiência.
Em audiência continuada, no dia 25/07/2018, foram ouvidas as testemunhas Jaqueline Bárbara dos Santos França, Flávia Almeida da Silva, Marivete dos Santos Machado dos Santos, Lia Mara Bidu Barreto, Francisco de Assis Filho e Antônio Bispo dos Santos; já na realizada no dia 17/08/2018 foram ouvidas as testemunhas Verônica Candeias dos Santos e Venildo Lobo Sales; na realizada em 31/08/2018 foi ouvida a testemunha Irlan de Jesus Trindade.
Observando-se os depoimentos prestados, não se pode extrair a certeza da ocorrência da conduta alegada pela parte investigante.
Em suas alegações finais o Ministério Público Eleitoral pugnou pela procedência da presente ação, com base no arcabouço probatório juntado aos autos, mormente o material apreendido e o depoimento da testemunha Angélica da Silva, já que as demais provas testemunhas se retrataram em audiência do depoimento prestado perante o órgão investigante.
De outra banda, o Investigado apresentou suas alegações finais às fls. 782/811, arguindo cerceamento de defesa, alegando que, quando da juntada da carta precatória, encaminhada ao juízo da cidade de Rio Grande/RS, ficou demonstrada a não localização da testemunha. Oportunidade em que assevera o investigado, o juízo Zonal abriu vista ao MPE, sem oportunizá-lo a sua defesa.
Tal ocorrência, alega a parte investigada, trouxe prejuízo à sua defesa, uma vez, conquanto, a testemunha que seria ouvida pelo juízo deprecado tenha sido arrolada pela parte adversa, considerando as diversas retratações ocorridas em audiência pelas testemunhas, aquela não localizada pelo juízo deprecado haveria também por se retratar.
Salientou, ainda, o Investigado, que a não localização da testemunha se deu pelo fato do oficial de justiça deprecado não ter observado o carimbo informando o novo endereço da testemunha, conforme fls. 768, dirigindo-se ao endereço anterior constante do corpo do instrumento.
No mérito, sustenta a improcedência da representação, visto que, afirma o Investigado não ter praticado os atos ilegais que lhes são imputados, e que dos depoimentos colhidos pelo investigante, na fase investigatória, houve a retratação na fase judicial, com exceção da testemunha Angélica, que manteve o quanto informado inicialmente, contudo no tocante a essa, houve contradições em seu depoimento perante o juízo, tais como a falta de certeza do valor supostamente ofertado, a falta de lembrança das instruções passadas pela suposta “aliciadora” , para a comprovação do voto efetuado; a contradição acerca do motivo que levou a referida testemunha a estar estava na via pública, quando teria sido abordada pela suposta “aliciadora” ; falta de clareza em indicar a pessoa que realmente teria lhe ofertado a “propina” , entre outras contradições em seu depoimento, constante das fls. 789/794.
Do necessário, é o relatório. DECIDO
Quanto à preliminar suscitada, nota-se que a determinação de vista ao Ministério Público Eleitoral, constante de fls. 784, refere-se à apresentação das suas alegações finais, conforme despacho de fls. 772, não sendo, como alega o Investigado, para se manifestar a respeito da Carta Precatória encaminhada ao Juízo Eleitoral de Rio Grande/RS, conforme texto expresso.
Ademais, ainda que somente o Ministério Público Eleitoral tenha sido notificado para se manifestar a respeito da não localização da testemunha pelo juízo deprecado, aquela prova testemunhal foi arrolada somente pela parte investigante.
O interesse processual da parte investigada, pelo depoimento da testemunha não localizada, arrolada exclusivamente pelo investigante, para os fins pretendidos por aquela, deveria se fazer acompanhar da demonstração de efetivo prejuízo à sua defesa, que não de ilações contrárias ao já constante dos autos, ou a condição de tornar imprescindível o seu testemunho, notadamente, quando, sequer está elencada no rol das testemunhas que arrolou, razões porque rejeito a arguição preliminar de cerceamento de defesa do Investigado.
Superada a arguição preliminar, no mérito, cumpri destacar aspectos entorno da tempestividade da apresentação das alegações finais a cargo do Ministério Público Eleitoral, certificada pelo Cartório Eleitoral da 127ª Zona/BA às fls. 814. Isso porque, há jurisprudência farta considerando a intempestividade Ministerial mera irregularidade, conforme consta das seguintes decisões:
TJ-RN – Habeas Corpus com Liminar: HC 20070079130 RN
Jurisprudência – Data de publicação: 29/02/2008
Decisão: finais do Ministério Público, há de se ressaltar que tais alegações não poderiam ser desentranhadas. ALEGAÇÕES FINAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO INTEMPESTIVAS. PRELIMINAR DE NULIDADE. REJEIÇÃO. I – Oferecimento de alegações finais pelo Ministério Público a destempo, trata-se de mera irregularidade.
TJ-RS – Apelação Crime: ACR 70076516426 RS
Decisão: também, não há que se falar em desentranhamento dos memoriais do Ministério Público por intempestivos. ALEGAÇÕES FINAIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO INTEMPESTIVAS NÃO CONSTITUI NULIDADE A INTEMPESTIVIDADE DE ALEGAÇÕES FINAIS DA ACUSAÇÃO NAS AÇÕES PÚBLICAS.
Ademais, importante registrar que num sistema de sufrágio universal, tenho observado que a intervenção da Justiça Eleitoral deve ser feita com a devida prudência, sob pena de um desvirtuamento da vontade popular.
Prosseguindo, apenas para não deixar qualquer dúvida a respeito da matéria a ser enfrentada nos presentes autos, impõe-se registrar que os fatos serão apreciados à luz do art. 22, da Lei Complementar n.° 64, de 1990, cujos fatos foram praticados sob a ótica de suposta violação ao art. 41-A da Lei 9.504/97.
Vale registro, os temos dispostos no art. 41-A da Lei nº 95.504/97:
Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990.
§ 1o Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.
§ 2o As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto
De acordo com o texto legal, temos que as condutas que caracterizam a infração em destaque, consistem naquelas levadas a efeito pelo candidato, que denotem as ações de doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, bem ou vantagem de qualquer natureza inclusive emprego ou função pública, com o fim de obter-lhe o voto, e que tenham sido praticadas no intervalo de tempo que medeia o registro da candidatura e o da eleição. Neste sentido, o Tribunal Superior Eleitoral entende que, para a penalização, faz-se necessária a prova robusta da participação, direta ou indireta, ou, ao menos, do consentimento do candidato.
No âmbito do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, a prova robusta da participação ou consentimento do representado é condição para a sua imputação, conforme:
Tribunal Regional Eleitoral da Bahia TRE-BA – Recurso Eleitoral : RE 17321 SERRA PRETA – BA
RECURSO EM AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE ESTEIO PROBATÓRIO ROBUSTO. DESPROVIMENTO.
Tribunal Regional Eleitoral da Bahia TRE-BA – Recurso Eleitoral : RE 20443 GUANAMBI – BA
RECURSO EM AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97 . NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DE ESTEIO PROBATÓRIO ROBUSTO. DESPROVIMENTO.
Não somente as provas testemunhais deixaram de traduzir uma certeza do quanto alegado pela peça acusatória da prática do crime previsto no art. 41-A da Lei nº 9.504/97, os próprios documentos apreendidos no procedimento investigatório não lograram tal êxito.
Posto isso, diante dos fatos comprovados, com base nos motivos acima, JULGO IMPROCEDENTE a presente ação de investigação judicial eleitoral.
Publique-se. Registre-se.
Transitando em julgado, arquivem-se os autos
Cumpra-se.
Jacobina-Ba, 24 de outubro de 2019.
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